domingo, 15 de junho de 2014

Futebol obrigação (parte 2): A prática esportiva (já) como meio de vida

  Encarar cedo o futebol como um meio de ascensão social para toda a família é um dos desafios enfrentados por aqueles que integram as categorias de base, o bom desempenho esportivo desses garotos é, muitas vezes, a esperança de melhora de vida de todos que o cercam e esse é um cenário já de grande responsabilidade, principalmente para um jovem de 14, 15 anos. O processo de formação de um futebolista de alto rendimento é demorado, segundo Carlos Thiengo, mestre em Ciências da Motricidade pela Unesp e que entre os anos de 2010 e 2013 trabalhou na base do São Paulo Futebol Clube "O jogador de futebol passa aproximadamente, durante dez anos, 5 mil horas na sua formação" e ao longo desse processo "se não existir um plano de desenvolvimento desse jogador nas diferentes fases a chance do fracasso e do dano emocional é muito grande", afirma Thiengo.  

Cozac, 22 anos de experiência na Psicologia do esporte/Arthur Sales
   João Ricardo Cozac, psicólogo do esporte que trabalhou em diversos clubes como Cruzeiro, Corinthians, Palmeiras, Goiás e Ituano concorda que as consequências de um insucesso na carreira esportiva sob as circunstâncias citadas são duras "como muitas vezes o futebol é o único caminho possível e viável no imaginário idealizado dessa criança, quando ela se vê fora do futebol, ela meio que perde o chão, o horizonte de crescimento, de realização profissional", conclui o psicólogo. Cozac também aponta o afastamento familiar como ponto negativo na vida dos atletas "eles ficam em um processo que a gente chama de representação social. São pessoas que não tem acesso à informação e criam conhecimento para poder sobreviver diante das dúvidas que tem em relação à vida. Então eu diria que a presença desse processo é muito forte dentro desses grupos por que eles são muito isolados do contato social e familiar", explica. 

   Por outro lado, sair de casa cedo, viver ao lado dos companheiros de equipe pode adicionar experiências diferentes das vivenciadas por quem não passa por essa prova, quando perguntado sobre a adolescência vivida longe da família Danilo Claro de Assis, 26 anos, afirma "vivi experiências incríveis que não troco por nada, conheci muita gente boa e muitos lugares. É legal ter crescido de uma maneira diferente do que como a maioria das pessoas com as quais convivo agora". O ex-futebolista busca não pesar os prós e contras dessa juventude não convencional, mas pondera que houve dificuldades "perdi muita coisa por conta de tudo isso. Você tem saber se virar sozinho, e fazer isso com 13 anos numa cidade grande saindo de Cabrália (360 Km de São Paulo) que tem 5 mil habitantes não foi fácil. Mas a pior parte é ficar longe da família e amigos, a saudade que dava de casa era muito grande", conta Danilo. 

   Apesar de acreditar que o modelo de alojamento, amplamente utilizado no país, não é o mais adequado para o desenvolvimento dos jovens futebolistas Cozac concorda que alguns aspectos dessa situação podem ser aproveitados "em termos de equipe, a moçada se conhece melhor, cria um vínculo de amizade, cria um vínculo de proximidade, isso tudo é muito importante na hora de jogar. Não tem aquela questão da solidão, você tem sempre um amigo para conversar, sempre uma referência, alguém mais próximo que você possa trocar ideia, falar das suas angústias", mas reitera que um acompanhamento psicológico através de um departamento próprio e bem estruturado é fundamental para o crescimento pleno e saudável dos jovens jogadores.

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