segunda-feira, 9 de junho de 2014

Futebol obrigação (parte 1): "realizando" o sonho

     Diamantes não são produzidos sob alta pressão, o processo, eficaz na indústria, não funciona com gente. Realizar o sonho dos pais, ser o responsável pela ascensão de toda uma família são alguns dos pesos que quando caem cedo demais sobre o ombro de jovens jogadores acabam atrapalhando seu desenvolvimento dentro e fora do gramado. 

     É comum perceber em competições entre escolinhas e até nos treinamentos, um clima de alta competitividade e algumas vezes até de hostilidade com insultos a adversários, árbitros e treinadores vindo das arquibancadas cheias de pais fanáticos por seus futuros craques. João Ricardo Cozac, presidente da Associação Paulista da Psicologia do Esporte diagnostica "o que o pai gostaria de ter sido ele projeta na criança, a possibilidade de concretização, de realização do seu próprio sonho" e conta que casos como o descrito não são raros "a cada dez sessões que eu tenho com criança aqui pelo menos três, quatro, tem que voltar para os pais", revela. O problema fica evidenciado quando o ânimo maior não vem de criança que pratica o esporte "eu pergunto para elas se elas gostam de jogar futebol, vejo respostas bastante desanimadoras e o pai sempre muito motivado, muito alegre, muito atento", diz o psicólogo.

Adriano orientando seus alunos de escolinha/Arthur Sales
     Adriano Leite, professor de uma escolinha na capital paulista há 19 anos, classifica como recorrente a situação "É um dos grandes problemas que nós temos lá. Pai que fica reclamando, cobrando do filho e o nosso objetivo lá é o prazer de jogar futebol. Nós visamos mais a parte do lazer, enquanto isso os pais levam mais em conta o resultado, a cobrança, aí acaba influenciando negativamente a criança", revela. Apesar de tentar contornar os incidentes dizendo a seus alunos que o pai naquele momento é só mais um torcedor, Adriano lamenta o fato de perder alguns atletas por causa da cobrança excessiva "A criança vai para se divertir, para brincar, lógico pensando em ser alguma coisa no futebol, mas às vezes vê que não tem potencial e quando há muita cobrança, quando ela vê que não está atingindo o objetivo chega uma hora que ela desiste antes do tempo", conta o treinador. 

     Como consequência, além de podermos perder grandes talentos no caminho, tendo em vista que o craque das categorias inferiores nem sempre é o do profissional e vice-versa, vemos então crianças que fecham as portas para um caminho que, traçado com sabedoria, traz inúmeros benefícios.

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