terça-feira, 30 de setembro de 2014

Entrevista: Uriel Jorge Marques

Uriel Jorge Marques, 30 anos, começou a jogar futebol na sua cidade natal, Guararapes (Região de Araçatuba, 520 Km de São Paulo) aos 10. Aos 16 foi tentar a sorte no Corinthians, voltou seis meses depois em razão da troca da comissão técnica do clube, mas teve nova chance na capital, dessa vez no São Paulo, onde acabou não se adaptando. Viveu seus melhores momentos no futebol nas nas duas vezes que disputou a Copa Rio pelo Guararapes Esporte Clube antes de se transferir para o União São João de Araras, onde uma séria lesão no joelho acabou com o sonho de viver do futebol. Uriel recebeu o Indústria de base no seu recém adquirido apartamento na cidade de Bauru, interior de São Paulo, longe dos gramados o emprego em um grande banco trouxe a estabilidade que o esporte não deu. O resultado do bate-bola bem informal que rolou na sua sala de visitas você confere abaixo. 
Uriel Jorge Marques, agora bancário, ex-Corinthians e São Paulo.


Sobre estar preparado para abandonar o futebol antes da lesão... 

     Longe disso, na verdade quando eu voltei, tinha esperança de recuperar e voltar a jogar por que até hoje é o que eu mais gostei de fazer, mas como a idade chega e as responsabilidades também, acabei deixando isso para trás.

Paralelamente ao futebol... 

     Eu sempre procurei estudar, nunca deixei a escola em troca do futebol. Na verdade até dei continuidade depois do futebol, mesmo por que com essa ida e vinda de clubes você acaba tendo que priorizar alguma coisa, mas eu nunca deixei de estudar tanto é que quando eu realmente parei, fui para São Paulo, cursei a faculdade de Educação Física, por que eu ainda estava no clima dessa área esportiva, apesar de até hoje estar, a gente não consegue se desvincular, mas de uma forma profissional eu não tinha me especializado em nada. Depois que eu me machuquei eu comecei mesmo a pensar um pouco fora do futebol

Planejamento da vida fora do esporte, o "plano B"...

     Acredito que hoje isso seja melhor apresentado para os atletas, na época que eu jogava não se dava muita importância para o estudo, o pessoal estudava mas não fazia questão de seguir certinho, isso estou falando em relação aos times de ponta que eu fui. Já aqui no interior eu peguei uma fase muito boa que o pessoal incentivava muito tinha até um campeonato que a gente jogava ali na região de Araçatuba que chamava "bom de bola, bom na escola", então eles faziam questão mesmo que os atletas estudassem, tivessem uma preparação legal, então o chamado "plano B" estava em evidência sempre, já que no futebol existe uma grande possibilidade de não dar certo.

Sair de casa cedo...

     Eu tenho um exemplo muito real que é meu irmão. Ele saiu de casa com 14, foi para a Ponte Preta, ficou lá mais de cinco anos, chegou até o profissional e nessa parte psicológica, se ele tivesse um acompanhamento mais contundente da família eu acredito que hoje ele estaria muito bem no futebol. Acho que se tiver um acompanhamento legal e um trabalho legal para quem tem talento, a chance de vencer é grande. 

Desperdício de talentos...

     Muitos se perdem pelo caminho, por "n" fatores. Acho que com um trabalho psicológico, uma estrutura legal não só dentro como fora de campo também, o Brasil tem muito a ganhar. 

Escola morando longe da cidade natal... 

     Quando se tem uma base muito boa de família a chance de você se perder acredito que seja menor. Até hoje ele tem uma dificuldade de retomar os estudos por que ele ficou parado lá, acabou não acompanhando muito bem a escola e ainda hoje ele não conseguiu se adaptar. Agora ele está voltando aos estudos, voltando a se inteirar de tudo por que você acaba ficando longe das coisas então você acaba se inteirando pouco, até você se adaptar de novo leva tempo. O meu exemplo é bom ser citado também por que fiquei, mesmo estudando certinho, saindo e voltando de casa e quando eu entrei na faculdade eu tive muita dificuldade. 

Agenciamento, olheiros... 

     Tinham esses campeonatinhos como eu já falei, em Araçatuba e região e tinha um cara que na linguagem do futebol é o olheiro, ele trabalhava para o Corinthians. Então eu me destaquei no campeonato local e junto com mais dois meninos eles me convidaram para ir para lá. No caso do meu irmão foi um pouco diferente, ele foi disputar um jogo em Rosana, jogou o time da cidade contra a Ponte Preta e ele fez uma ótima partida, fez os dois gols do jogo que terminou 2 a 2, aí a Ponte cresceu o olho e ele tava muito bem na época tanto é que ele ficou 5, 6 anos lá. Então funcionava com os olheiros lá da região e quem se destacava eles acabavam levando e ainda hoje isso acontece, inclusive com esse mesmo cara que me levou para o Corinthians. 

Ex-companheiros de Guararapes...

     90% está bem. Dentro do futebol tem poucos, mas é a proporção mesmo né? De quem acaba despontando, mas a maioria do pessoal está bem em caminhos diferentes do que no futebol, mas graças a Deus todos bem e colocados no mercado. No futebol dois ou três, um cara que jogou comigo lá no Guararapes está no Braga já vai fazer oito anos, é o Márcio Mossoró (ele mesmo), inclusive com o mesmo empresário que na época era o meu.

Tratamento e estrutura nos times que passou...

     Para comer, treinar, ônibus essas coisas não via diferença entre profissional e amador. A gente almoçava junto com Rogério Ceni, Kaká... Então todos comiam a mesma comida, no Corinthians também é só questão de alojamento mesmo, mas nos três clubes que passei os alojamentos eram bons. 

Assédio moral, assédio sexual e pedofilia...

     Existe bastante. Em relação à cobrança excessiva parte são ossos do ofício, a maturidade vai se criando de acordo com essa vivência, lógico que acredito que existam excessos. Essa outra parte de assédio sexual tem muito dentro do futebol, principalmente na categoria de base, a gente que já passou um tempo na estrada já viu bastante coisa. 
     O pessoal mais novo fica muito vulnerável, então esse pessoal se aproveita da imaturidade do menino para poder levar vantagem, de repente oferecer alguma coisa que ele não tinha em casa e ele está achando que está conquistando. Então acho que grande parte do assédio, nessa questão sexual, é muito em cima disso, é propor uma chuteira nova, uma passagem ida e volta para casa e o pessoal usa de má fé para se aproveitar dessa parte do atleta em formação.  
     As vivências que eu tive a oportunidade de ver são todas de dentro do clube. Não estou falando que foi dentro desse ou daquele clube que eu tenha jogado, eu dentro do mundo do futebol soube disso. 

O auge... 

     Por mais que eu tenho ido para o São Paulo, Corinthians, União São João de Araras, acho que o momento mais importante para mim foi no Guararapes Esporte Clube. Nós fomos dois anos até o Rio, para disputar a Copa Rio e em um ano nós chegamos nas oitavas-de-final, a gente tinha jogador 82,83,84 e eu era 84, a idade mais nova. Eu fui como reserva voltei como titular e nas oitavas perdemos para o Fluminense que foi o campeão. 

Melhor jogador que viu jogar...

     Márcio Mossoró. Não é à toa que chegou onde chegou. 

O que dá para melhorar na base...

     Tem que se preocupar sim com a formação do atleta, se ele está estudando, se ele está com a família, onde ele está quando não está treinando, esse acompanhamento é muito importante. O talento do brasileiro para o futebol nasce naturalmente então o importante é formar um bom ser humano por que o futebol está na alma. 

Um comentário:

  1. Parabens Uriel sua história e muito comovente.Sua paixão pelo futebol como diz e muito forte apesar das descepcoes sempre manteve firme trilhando o caminho do Bem

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